AVC

AVC é reclassificado como doença neurológica

Apesar de de base neurológica, o AVC era desde 1955 classificado no grupo das doenças circulatórias

publicado 26/02/2022, atualizado 26/02/2022

por Alan Cronemberger Andrade


O acidente vascular cerebral (AVC), popularmente também conhecido no Brasil como derrame, foi colocado na Classificação Internacional de Doenças (a famosa CID) desde 1955 como doença do aparelho circulatório, mas agora foi classificado como uma doença neurológica na nova publicação da CID-11, publicada em versão final agora em fevereiro de 2022. Essa mudança foi perceptível e o AVC foi então reclassificado.


A classificação da CID é um importante instrumento de catálogo e sistematização das doenças e faz com que sistemas de saúde em todo o mundo adotem uma uniformização para separar as doenças, e poder estuda-las adequadamente, avaliando assim como elas atingem a coletividade. Perguntas tais como: "Qual a prevalência da doença? Quantos casos ocorrem por ano? Qual doença aumentou? Qual doença diminuiu? Quais as doenças emergentes?" - podem ser respondidas a medida que classificamos e separamos as doenças em grupos e individualmente.


A discussão parece ter um caráter tando político quanto científico. Associações ligadas a Neurologia, como a Academia Européia de Neurologia (EAN), argumentam que a classificação como uma doença neurológica traz benefícios para a sociedade na medida em que incentiva uma maior atenção das políticas públicas para as doenças neurológicas. A reclassificação é fruto de uma luta burocrática entre os clínicos e a Organização Mundial da Saúde.

Sede da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Genebra, na Suíça. Organização foi fundada em abril de 1948. As origens da CID remetem a 1860, mas a OMS passou a patrocinar a classificação também a partir de 1948.

A EAN comemorou a mudança, e diz que ela reflete com precisão a fisiopatologia e os sintomas do acidente vascular cerebral que levam à mortalidade e morbidade, que são os da disfunção cerebral. A nova categorização também é consistente com a de outras doenças listadas em seus respectivos órgãos em iterações anteriores da CID. Observou-se, no entanto, que com exceção da doença de Alzheimer, que é classificada no Capítulo 8, “Doenças do sistema nervoso”, as categorias de demência permanecem no capítulo 6, “Transtornos do comportamento mental ou do neurodesenvolvimento”, refletindo as manifestações clínicas da demência ao contrário da fisiopatologia que pode é a base do problema. "É nosso entendimento que esta classificação foi fortemente influenciada por associações científicas no campo da psiquiatria, psicologia e disciplinas afins." - diz a EAN.


A Federação Europeia de Associações Neurológicas (EFNA) expressou a opinião de que as demências são doenças neurológicas degenerativas devido à sua fisiopatologia clara. Essa é uma visão compartilhada pela EAN. "Nós nos juntamos aos nossos parceiros na iniciativa OneNeurology na esperança de que futuras iterações do CID unam as categorias de demência sob um único título de doenças do sistema nervoso. A consolidação de todos os distúrbios neurológicos em uma categoria ajudaria a refletir seu status combinado como a principal causa de anos de vida ajustados por incapacidade (DALYs) e a segunda principal causa de mortes globais (ambas sendo as terceiras principais causas na União Européia e na região da UE da OMS)." - diz o Dr. Claudio Bassetti, Presidente da EAN. No Brasil, a estimativa é de que tenhamos 1,8 milhão de pessoas vivendo com demências.

A correta classificação das doenças determina melhor distribuição dos recursos em saúde, o que também vale para as doenças neurológicas. Imagem: @nci

O Dr. Bassetti, escreveu que "também nos juntamos à EFNA para instar a OMS e os governos nacionais a acelerarem os esforços que levem à implementação da CID-11 – incluindo a integração total do acidente vascular cerebral na saúde neurológica – para alinhar com as mais recentes evidências científicas e práticas clínicas". Segundo suas palavras, isso poderá ajudar a priorizar e distribuir recursos públicos para o AVC, muitas vezes limitados, de acordo com as evidências científicas mais recentes e robustas.


Na notícia publicada no site da EFNA a associação comenta que alguém que tem uma doença crônica, como diabetes ou doença de Parkinson, tem o código CID e normalmente ele seguirá registrado no seu histórico médico. Esses códigos poderiam assim garantir que se receba o tratamentos adequados e que seja faturado corretamente qualquer serviço médico recebido. É importante lembrar que isso ocorre tanto na medicina privada, quando na saúde pública. E continua: "As companhias de seguros médicos esperam que os códigos sejam consistentes entre a condição de saúde e o tratamento prestado. Os códigos são ainda seguidos em ensaios clínicos para recrutar e rastrear indivíduos."